Protestos pelo Brasil pedem revogação do novo modelo
O professor José Alves — da Unifesp — elenca dez razões objetivas para que o novo Ensino Médio seja revogado. Para o docente, reforma é barbárie, principalmente para estudantes de escolas públicas.
Dez razões objetivas para você entender por que é necessário revogar o novo Ensino Médio
Por José Alves (professor da Unifesp)
1. Na terceira série do ensino médio, os alunos da escola pública paulista passaram a ter, por semana, apenas 3 aulas de Língua Portuguesa e 2 de Matemática. Todas as demais matérias são de disciplinas dos itinerários com quase nada de conteúdos. ENQUANTO ISSO, NA MESMA SÉRIE, OS FILHOS DA CLASSE MÉDIA E ALTA PASSAM A TER AULAS DE REFORÇO, REVISÃO E SIMULADOS NAS AULAS REGULARES, ALÉM DE FAZEREM CURSINHOS NO CONTRATURNO PARA PODEREM SE PREPARAR PARA O ENSINO SUPERIOR.
2. Essas disciplinas dos itinerários são de assuntos bem gerais e vagos. Pelo Brasil, já foram identificados temas como ‘Brigadeiro caseiro’, ‘Mundo PET’, ‘RPG’ etc. Em São Paulo, na parte diversificada, há desde Empreendedorismo (obrigatório) até eletivas para ensinar maquiagem.
3. Se uma única escola conseguir oferecer os 11 itinerários formativos propostos em São Paulo, realmente deixando o estudante escolher qual ele quer cursar, então A ESCOLA TERÁ QUE OFERECER 276 DISCIPLINAS POR SEMANA. Não há gestor escolar que administre isso. Não há nem espaço físico para comportar as horas de estudo e de preparo de aulas destes professores nas escolas.
4. Além disso, não há professor formado para essas 276 disciplinas dos itinerários. Por isso, as escolas oferecem poucos itinerários e, mesmo assim, estão contratando todo tipo de profissional sem formação para dar aulas para adolescentes (que é um dos trabalhos que mais exigem especialização no mundo todo): dentistas, administradores de empresas, bacharel em direito, engenheiros etc. Esses profissionais têm implorado por material e formação aos diretores de escola para seguirem com as aulas.
5. Os professores que têm licenciatura e dão aulas nas redes fogem o quanto podem dessas disciplinas dos itinerários, preferindo dar aulas dos assuntos que estudaram. Porém, como a quantidade de aulas de suas matérias foi reduzida, eles pegam muito mais turmas para completar a jornada, aumentando enormemente seu cansaço, tornando inviável conhecer seus alunos.
6. Como é pequena a quantidade de aulas das disciplinas desses itinerários, um mesmo profissional chega a receber a tarefa de ministrar aulas de até 10 disciplinas diferentes por semana, inclusive para as mesmas turmas. Os alunos de uma mesma turma sequer sabem qual é a disciplina que o professor ministra em determinado momento. Imagine a jornada deste professor: 10 aulas diferentes para preparar, 10 planos de aula, 10 formas de avaliar etc.
7. Os diretores estão há meses tentando atribuir aulas dessas disciplinas, sem sucesso. Muitos profissionais aceitam pegá-las e desistem quando entendem o que é para fazer na prática. No ano passado, em agosto, quase 30% dessas aulas ainda estavam sem professor na rede estadual paulista.
8. Essa parte diversificada do currículo tem, supostamente, o objetivo de preparar para o mundo do trabalho. Ocorre que, para a maioria das profissões, é necessário fazer estágio, cursar determinados conteúdos, além de outras regulações profissionais. Nada disso é proposto na reforma.
9. As escolas privadas driblam a reforma com aumento de horas na escola ou colocando os mesmos conteúdos que davam antes, mas com outros nomes de disciplinas. Assim, há registros de disciplinas dos itinerários como “química olímpica”, “biologia prática”, “linguística olímpica”, “história da arte” etc.
10. Com a reforma do ensino médio, nenhuma escola do Brasil tem o mesmo currículo, nem que estejam numa mesma rua.
Por isso, há uma revolta generalizada dos alunos, professores e gestores com essa reforma, que é defendida apenas pelas fundações empresariais e pelos secretários de educação que, em sua maioria, são muito próximos dessas mesmas fundações (vários ex-funcionários delas). A criação de tantas disciplinas, sem nenhum aumento de verba para dar condições de infraestrutura e preparo para os professores e gestores, parece ter o objetivo de vender materiais e cursos que essas mesmas fundações elaboraram, além é claro de evitar que os mais pobres ascendam para determinadas carreiras mais valorizadas ou para o ensino superior.
Em suma, é a barbárie.
Alunos do Instituto Federal de RO protestam contra reforma do Ensino Médio em Porto Velho
Estudantes do Instituto Federal de Rondônia (Ifro) se manifestaram contra a reforma do ensino médio, proposta pelo Ministério da Educação, na manhã desta quarta-feira (15), em Porto Velho.
O modelo de ensino aprovado em 2017, e implementado gradualmente em todas as escolas públicas e particulares desde 2022, aumenta a carga horária dos colégios, muda a distribuição de disciplinas no currículo e possibilita que os alunos escolham em quais áreas vão se aprofundar.
- Novo Ensino Médio: ajustar ou revogar? Entenda em 7 pontos o debate que envolve alunos e MEC
São mudanças que, embora tenham pontos positivos, vêm enfrentando críticas pela maneira como estão sendo implementadas no dia a dia dos estudantes.
No começo de março, o Ministério da Educação (MEC) decidiu realizar audiências públicas, oficinas de trabalho, seminários e ouvir a sociedade civil, a comunidade escolar, equipes técnicas dos sistemas de ensino, pesquisadores e especialistas em educação para debater a necessidade de reformular o Novo Ensino Médio.
Governo abre consulta pública sobre novo ensino médio
O Ministério da Educação (MEC) abriu consulta pública para avaliação e reestruturação da política nacional de ensino médio. A portaria foi publicada nesta quinta-feira no Diário Oficial da União e dá prazo de 90 dias para as manifestações, com possibilidade de prorrogação.
A consulta será implementada por meio de audiências públicas, oficinas de trabalho, seminários e pesquisas nacionais com estudantes, professores e gestores escolares sobre a experiência de implementação do novo ensino médio nos 26 estados e Distrito Federal.
As ações serão coordenadas pelo MEC, por meio da Secretaria de Articulação Intersetorial e com os Sistemas de Ensino (Sase), com a colaboração do Conselho Nacional de Educação (CNE), do Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais e Distrital de Educação (Foncede) e do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed).
Após o prazo de manifestações, a Sase terá 30 dias para elaborar o relatório final a ser encaminhado ao ministro da Educação, Camilo Santana.
De acordo com o MEC, o objetivo da consulta é “abrir o diálogo com a sociedade civil, a comunidade escolar, os profissionais do magistério, as equipes técnicas dos sistemas de ensino, os estudantes, os pesquisadores e os especialistas do campo da educação para a coleta de subsídios para a tomada de decisão do Ministério da Educação acerca dos atos normativos que regulamentam o novo ensino médio”.
A atual política de ensino médio foi aprovada por lei em 2017, durante o governo do ex-presidente Michel Temer, com o objetivo de tornar a etapa mais atrativa e evitar que os estudantes abandonem os estudos.
A implementação ocorre de forma escalonada até 2024. Em 2022, ela começou pelo 1º ano do ensino médio com a ampliação da carga horária para pelo menos cinco horas diárias. Pela lei, para que o novo modelo seja possível, as escolas devem ampliar a carga horária para 1,4 mil horas anuais, o que equivale a sete horas diárias. Isso deve ocorrer aos poucos.
Com o novo modelo, parte das aulas será comum a todos os estudantes do país, direcionada pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Na outra parte da formação, os próprios alunos poderão escolher um itinerário para aprofundar o aprendizado. Entre as opções, está dar ênfase, por exemplo, às áreas de linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas ou ao ensino técnico. A oferta de itinerários, entretanto, vai depender da capacidade das redes de ensino e das escolas.
Em 2023, a implementação segue com o 1º e 2º anos e os itinerários devem começar a ser implementados na maior parte das escolas. Em 2024, o ciclo de implementação termina, com os três anos do ensino médio.
No início desta semana, entidades de trabalhadores da educação se reuniram com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pedindo a revogação da política. Na semana passada, em nota, o MEC reconheceu que houve falta de diálogo no processo que levou à promulgação da lei do novo ensino médio e anunciou a criação de um grupo de trabalho para reunir todos os setores educacionais interessados em discutir o andamento do novo ensino médio.
Fonte: Robert Muracami, youtube.com/@bandjornalismo, deverdeclasse.org, g1.globo.com, agenciabrasil.ebc.com.br